Português é uma língua viva, flexível e variável
“Antigamente, as moças chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas. Não faziam anos: completavam primaveras, em geral, dezoito. Os janotas, mesmo não sendo rapagões, faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio. E, se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em outra freguesia. As pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca, e não caíam de cavalo magro. Algumas jogavam verde para colher maduro e sabiam com quantos paus se faz uma canoa. O que não impedia que, nesse entrementes, esse ou aquele embarcasse em canoa furada. Encontravam alguém que lhes passava a manta e azulava às de vila-diogo. Os mais idosos depois da janta, faziam o quilo, saindo para tomar a fresca; e também tomavam cautela de não apanhar sereno. Os mais jovens, esses iam ao animatógrafo, e mais tarde ao cinematógrafo, chupando balas de altéia. Ou sonhavam em andar de aeroplano; os quais, de pouco siso, se metiam em camisa de onze varas, e até em calças pardas; não admira que dessem com os burros n’água.”
Antigamente – Carlos Drummond de Andrade
O trecho acima, retirado de uma obra de Drummond, mostra muito bem como a língua e o uso que as pessoas fazem dela mudam com o passar dos tempos. A variação linguística e a oralidade são, pois, os temas deste texto.
Sem nos darmos conta, fazemos muitas modificações no léxico (estrutura das palavras) e na sintaxe (estrutura da frase), mas percebemos essa mudança, principalmente, quando escrevemos formalmente e quando conversamos com alguém mais íntimo. Por questão de escolha, ou até mesmo por desconhecimento, reduzir a palavra se torna mais fácil e mais prático para um uso corriqueiro.
Há diversos exemplos de palavras e expressões no trecho acima que mostram essa variação histórica e atuante na língua. Mademoiselles, completar primaveras, dessem com os burros n’água e saindo para tomar a fresca são faladas atualmente, respectivamente, deste modo: meninas/moças, fazer aniversário (niver para aqueles que reduzem), se dar mal e dar uma volta ou ainda dar um rolé ou rolê.
Nada disso, como vimos, é recente. Um exemplo claro e presente no nosso cotidiano é o uso da palavra você. Ela sofreu as seguintes transformações : vossa mercê > vossemecê > vosmecê > você > ocê > cê. Para muitos estudantes, fica difícil entender por que você é um pronome de tratamento e não um pessoal já que não tem noção da origem dessa palavra. Inicialmente, ela era usada de maneira formal e refinada para se referir alguém de forma respeitosa, como Vossa Excelência e Vossa Santidade. Há ainda outra substituição para o você: o pronome pessoal tu, sem que o verbo se adeque à nova escolha. Você está percebendo como a gente faz a diferença no português e nem repara?
Existem milhares de novos usos para palavras e expressões antigas e isso é ótimo, porque mostra como o português é uma língua viva, flexível e variável.
Que orgulho, né?!
Bons estudos!
PenseBem
Professora Patrícia